quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

´Só as mulheres amam' - José Pedro Goulart

Li, reli, li de novo...
Gostei do que li.
Nessa onda de acharmos que nossa sociedade muda o tempo todo, apresenta-se com uma memória curtíssima, encara problemas sérios como aspectos 'normais' da vida dos indivíduos, achei uma coisa que penso nunca ter mudado...As mulheres amam e amam muito. Sim, sem dúvida!
Amamos e talvez nem saibamos o quanto amamos. Pior que isso é que os alvos de nosso amor, carinho e afetos infinitos não se dão conta disso. Lástima. Como uma amiga nova, mas que parece ser de sempre, disse-me hoje mesmo:
Alguns parecem tão estúpidos...
Talvez não se faça necessário sermos tão enfáticas ou radicais assim. Os admiro profundamente, mas...realmente...às vezes...

Melhor lerem.

Gastei uma vida sem saber - e de repente esse pensamento se instalou em mim feito uma bactéria oportunista: só as mulheres amam. Aos homens, esse é um benefício relativizado. O homem luta pelo amor da mulher, disputa esse amor; e quando o recebe, sacia-se, lambuza-se com ele, liga o plugue que a natureza lhe deu na cavidade receptora que natureza deu a ela e recarrega a si de energia vital. Parece recíproco, mas não é.
Eis o papel da mulher no mundo, produzir amor. Tal como a selva amazônica produz oxigênio. Ao homem cabe decifrar e devorar. Decifra com poemas, canções e poréns. Devora com o verbo, engole com a palavra. Pinta quadros, cria partituras, filosofa. Enquanto o homem cria, a mulher gera. A mulher olha, entende, e perdoa. Por amor. O homem não olha, não entende e, se perdoa, é por conveniência.
E não é só em casamentos tradicionais. Veja o caso da Igreja - entre freiras e padres, quem de verdade esta ali em renúncia por amor? Uma freira não reza a missa, não batiza ou recebe confissão. Ama apenas, sobre todas as coisas. Inclusive sobre sua própria condição de oprimida. Da mesma forma que uma ama é capaz de amar o filho de outra mulher como se fosse dela. (Existem babás homens? Existe professor de primário?)
Mas há obstáculos. A sociedade neurotizada por objetivos eminentemente masculinos exige avanços, conquistas. É o suplício da submissão coletiva. Todos dizem que é preciso ter um norte. Como o ímã de uma bússola apontando sempre para lá. Quem inventou a bússola? Fosse uma mulher e uma bússola apontaria para o sul - de lá é que vem os ventos que espalham a vida. (E giraria todos dias entre os quatro pontos cardeais.)
E há o silêncio. E isso é o mais notável. Só uma mulher consegue amar onde não entende. Entender significa apalavrar. A palavra sempre é menos que o sentido. A palavra é um choque de realidade. E quem quer saber da realidade? Quem são os suspeitos de racionalizar as coisas? A realidade condena, o delírio liberta.
Não, não sou ingênuo, sei o quanto uma mulher pode usar o amor ao reverso. Como sei da secura que vem da resistência. Mas este não o meu ponto aqui. De modo que declaro que estou ciente dos riscos que corro ao dizer que pertenço a tribo dos inaptos. É que minha consciência se elabora quando me disponho.
Portanto, convoco aos senhores para que entreguem as armas. Senhoras, por gentileza, assumam. O caos reina onde o amor desaparece. E alguém duvida do caos?
Twitter: @ZPgoulart

José Pedro Goulart é cineasta e jornalista

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